Número 66

São Paulo, quarta-feira, 28 de abril de 2004 

«Hoje estou bêbado/ de universo.» (Giuseppe Ungaretti)
 


Augusto de Campos


Caros,

Já apresentei neste boletim poemas traduzidos com invulgar criatividade e perícia pelo poeta paulistano Augusto de Campos (1931-). Chega, agora, a oportunidade de mostrar trabalhos do próprio Augusto.

Como se sabe, Augusto de Campos, junto com seu irmão Haroldo de Campos  e o amigo Décio Pignatari, é fundador da poesia concreta, o movimento literário que mais deu o que falar dos anos 50 até hoje. Baseados na ruptura com o verso e na exploração de recursos "verbivocovisuais", os poetas concretos criaram trabalhos de natureza icônica, nos quais o poema tende a ser uma representação objetiva da própria coisa de que trata.

Um exemplo dessa concretude é dado pelo poema "pluvial/fluvial", escrito nos primeiros tempos do movimento. Nele, a disposição tipográfica das palavras "pluvial" e "fluvial" mimetizam a chuva e, ao mesmo tempo, o rio formado pela água da chuva.

Muitos poemas escritos nessa fase — anos 60 e 70 —, especialmente os de Augusto e de Pignatari, evoluem para composições em que desaparecem a palavra e mesmo os sinais alfabéticos. São criações que aproximam a poesia concreta da arte gráfica, da pintura e da escultura.

Os outros poemas ao lado são dos anos 80 e 90. Neles já se nota um retorno ao verso e à sintaxe, disfarçado por artifícios tipográficos. O poema "pós-tudo", de 1984, contém uma espécie de balanço do trabalho de Augusto, ou da própria poesia concreta.

Augusto de Campos também desenvolveu criações que envolvem dobraduras de papel ("poemóbiles") e poemas que utilizam computação gráfica, animações sonorizadas e holografias. Alguns desses objetos se movimentam conforme a interação do leitor.

Logicamente, nenhum desses itens multimídia poderia ser reproduzido aqui. Já foi difícil manter a fidelidade aos poemas transcritos ao lado. Para isso, tive de recorrer ao scanner. O que você vê ao lado são fac-símiles dos poemas.

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Não há dúvida de que a poesia concreta exerceu (e ainda exerce) ampla influência na poesia e também nas letras de música popular. Na poesia, boa parcela dos poetas de 70 para cá exibem a marca dos Campos. Na música, a maior influência se nota no trabalho dos tropicalistas, em especial no de Caetano Veloso, que também musicou poemas de Augusto e de Haroldo de Campos.

Atualmente, a poesia concreta já não projeta tanta influência. O próprio Haroldo de Campos, falecido em 2003, dizia que já não escrevia poesia concreta.

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Além do trabalho poético, Campos também desenvolve intensa atividade de tradução e produção de ensaios. Para ver mais poemas de Augusto de Campos e obter mais dados sobre seus ensaios e traduções,  visite o site oficial do poeta.


Um abraço, e até a próxima.

Carlos Machado

 

Poesia pós-tudo

Augusto de Campos

 


pluvial / fluvial (1954-1960)




pós-tudo  (1984)



nãomevendo (1988)



pós-soneto (1990/91)


poesia.net
www.algumapoesia.com.br
Carlos Machado, 2004

Augusto de Campos
•  "pluvial/fluvial"
    In Viva Vaia (Poesia 1949-1979)
   
Livraria Duas Cidades, São Paulo, 1979
•  "pós-tudo", "nãomevendo", "pós-soneto"
    In Despoesia
   
Ed. Perspectiva, São Paulo, 1994