Amigas e amigos,
Este é nossa edição n. 550 — um belo número redondo, equivalente a 50 coleções de 11 boletins. Às vezes, nem eu mesmo acredito que
chegamos tão longe. Mais uma vez, viva a Poesia! E vamos em frente.
•o•
O autor em destaque nesta edição é conhecido de longa data por quem acompanha o poesia.net. Poeta e tradutor, Ruy Proença
já compareceu várias vezes a esta página. Desta vez, ele retorna trazido por dois de seus novos trabalhos, as plaquetes Coeficiente
de Adversidade (Primata, 2025) e Frente Fria (Galileu Edições, 2024).
Edições leves e simpáticas, muito bem diagramadas, esses cadernos — um com 17 e o outro com 15 poemas — constituem um meio interessante
de publicar poesia. Normalmente, as coletâneas poéticas reúnem duas, três ou mais divisões, cada uma contendo textos associados a
uma ideia ou temática. A plaquete, de certo modo, equivale a uma dessas divisões, distribuída de forma isolada.
•o•
Em Coeficiente de Adversidade, Ruy Proença apresenta poemas que refletem sobre o decurso do tempo e nossas mudanças físicas e
psicológicas diante do fluir dos anos, especialmente o envelhecimento e a perspectiva concreta de um dia não estarmos mais aqui.
Frente Fria, a outra plaquete, reúne poemas voltados para pequenas experiências do dia a dia, tais como cortar as verduras
para fazer uma salada; a mulher que passa de bicicleta; ou o pensamento que vagueia em torno de situações triviais — ou da mais alta
expressividade, a exemplo do Big Bang.
Para esta edição, selecionei quatro poemas de Coeficiente de Adversidade e dois de Frente Fria. Vamos à leitura.
•o•
No primeiro poema, “Passagem para o Inorgânico”, o poeta compara a velhice a um fenômeno das árvores urbanas: “a velhice/ é como
uma folha seca/ que se desprendeu”. Em “Longevidade” vem outra vez a passagem do tempo, a chegada da velhice e as transformações
no corpo: “a velhice/ chegou// altura e peso/ diminuem sem parar”.
Com o tempo vêm também as transformações nos hábitos e costumes, e mesmo a mudança nos objetos do cotidiano. É o que
discute o poema “Contra o Amor e a Guerra Não Há Guarda-Chuva”. Diz o poeta: “daqui a vinte anos/ se alguém ainda me ler/
talvez esse alguém/ nem saiba mais/ o que foi drone ou telefone”. Mas o desaparecimento não se resume aos objetos.
Com alta dose de realismo, o poema avança: observa que, “daqui a vinte anos”, talvez o poeta também esteja “dissolvido/
apagado/ morto/ na noite insone”.
O poema “Publicidade” bate na mesma tecla do anterior, com uma pequena ajuda da mitologia grega. O texto é um anúncio da
empresa de turismo Caronte S.A., que convida para a excursão Meandros do Estige. Ou seja, um passeio pelo rio Estige,
ao longo do qual o barqueiro Caronte (aqui, pelo jeito, dono da empresa) transporta as almas dos mortos recentes.
Ironicamente, o anúncio recomenda que os passageiros levem chapéu e protetor solar. Turismo de primeira (e última) classe.
•o•
Vêm agora os poemas de Frente Fria. “Cura” parte de uma situação banal (a quebra de um vaso) para fazer uma reflexão
cheia de verdade: “melhor/ um vaso/ de cacos colados/ que/ um não-vaso”.
Em “Lago das Pombas” a personagem principal é uma ave pousada no beiral de uma escola de balé. O narrador supõe o que porventura
pensa essa pomba musical e todo o poema vai desaguar nas bailarinas adolescentes que, como a ave visitante, “quase voam” em seu bailado.
•o•
Nascido em São Paulo, Ruy Proença (1957), é engenheiro formado pela USP. Estreou na poesia com o livro
Pequenos Séculos (Klaxon, 1985). Publicou em seguida os seguintes títulos: A Lua Investirá com Seus Chifres
(Giordano, 1996); Como um Dia Come Outro (Nankin, 1999); Visão do Térreo (Editora 34, 2007); Coisas Daqui
(SM, 2007); e Caçambas (Editora 34, 2016). Proença traduziu os poetas franceses Boris Vian e Paol Keineg
(Histórias Verídicas (Dobra, 2014).
O autor já esteve aqui no poesia.net nas edições
n. 441 (2020);
n. 343 (2015);
n. 267 (2009);
e n. 43 (2003).
Um abraço, e até a próxima,
Carlos Machado
•o•
Visite o poesia.net no Facebook e no Instagram.