Carlos Drummond de Andrade
100 anos: 1902-2002
Com o poema "Áporo" tive o meu primeiro alumbramento poético.
Garoto de colégio, eu já lia o poeta com o maior interesse. Só que esse
poema me fascinava e, ao mesmo tempo, desafiava. Que diabo queria dizer esse
soneto?
Até que um dia fui procurar o título do poema no dicionário Caldas Aulete.
Lá, descobri que áporo (do grego a+poros, sem passagem, sem saída)
quer dizer pelo menos três coisas: 1. problema insolúvel; situação sem
saída; 2. uma espécie de inseto que cava a terra; e 3. uma orquídea verde.
(Curioso: nem o Aurélio nem o Houaiss, hoje, trazem esses três
significados. Ambos dão somente um, o primeiro.)
Li o verbete no dicionário e retornei ao poema. Foi realmente um êxtase, um
momento de iluminação. Os três significados — e muito mais — estão lá.
“Áporo” já mereceu análises de especialistas como Décio Pignatari, Davi
Arrigucci Jr. e Francisco Achcar. Deste último, veja o livro Folha
Explica Carlos Drummond de Andrade, Publifolha, 2000. Para uma consulta
rápida, parte dessas análises está num ensaio
neste link.
|
Um inseto cava
cava sem alarme
perfurando a terra
sem achar escape.
Que fazer, exausto,
em país bloqueado,
enlace de noite
raiz e minério?
Eis que o labirinto
(oh razão, mistério)
presto se desata:
em verde, sozinha,
antieuclidiana,
uma orquídea forma-se.
Carlos Drummond de
Andrade
In A Rosa do Povo
José Olympio, 1945
© Graña Drummond
|