Número 17

São Paulo, quarta-feira, 30 de abril de 2003 

"Com pedaços de mim eu monto um ser atônito." (Manoel de Barros)
 


Guilherme de Almeida


Caros,

O haikai, vocês sabem, é aquela pequena composição poética japonesa formada por três versos, de cinco, sete e cinco sílabas métricas, nesta ordem.

Em geral, os haikais são textos comtemplativos e refletem momentos de observação da natureza: a folha que cai, o nascer do sol, a passagem do tempo.

Tradicionalmente, é uma forma poética que não contém rimas. No entanto, o poeta paulista Guilherme de Almeida (1890-1969) decidiu reinventá-la, recriando-a num formato bem pessoal. Em seus haikais abrasileirados, o primeiro verso rima com o terceiro e o segundo inclui uma rima interna, na segunda e na sétima sílabas.

Com seus haikais, Guilherme de Almeida criou admiráveis pílulas de poesia, que o classificam como um mestre do gênero. Ao lado, algumas delas.


Um abraço,

Carlos Machado



 

O mestre do haikai

Guilherme de Almeida

 


CIGARRA


Diamante. Vidraça.
Arisca, áspera asa risca
o ar. E brilha. E passa.


CHUVA DE PRIMAVERA

Vê como se atraem
nos fios os pingos frios!
E juntam-se. E caem.


OUTUBRO

Cessou o aguaceiro.
Há bolhas novas nas folhas
do velho salgueiro.


O HAIKAI

Lava, escorre, agita
A areia. E, enfim, na bateia
Fica uma pepita.


NOTURNO

Na cidade, a lua:
a jóia branca que bóia
na lama da rua.


HORA DE TER SAUDADE

Houve aquele tempo...
(E agora, que a chuva chora,
ouve aquele tempo!)


OS ANDAIMES

Na gaiola cheia
(pedreiros e carpinteiros)
o dia gorjeia.
 

QUIRIRI

Calor. Nos tapetes
tranqüilos da noite, os grilos
fincam alfinetes.
 

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Carlos Machado, 2003

•  Guilherme de Almeida
    "Os Meus Haicais"
    In Poesia Vária
   
1947