Joaquim Cardozo
Caros,
O pernambucano Joaquim Cardozo (1897-1978) tinha a capacidade de promover a
conciliação de pólos aparentemente contrários: era poeta e calculista de
concreto.
Como engenheiro, especialista em cálculo estrutural, Cardozo, a convite de
Oscar Niemeyer, tornou-se responsável por alguns dos prédios de maior destaque
em Brasília, entre eles a Catedral.
Como escritor, publicou livros de poesia e de teatro. Os textos mostrados aqui
foram extraídos do volume Poesias Completas (Civilização Brasileira,
1979). Os poemas "Recordações de Tramataia" e "Chuva de Caju" pertencem ao seu
primeiro livro
Poemas, publicado em 1947.
A principal característica da poesia
de Cardozo, nessa obra, é esse lirismo bonito, associado à gente e à terra
pernambucanas. Embora o livro seja de 1947, os dois poemas são da década
anterior.
Lamentavelmente, se você procurar nas livrarias, não vai encontrar, hoje, nenhum
livro do poeta Joaquim Cardozo.
Um abraço, e até a próxima.
Carlos Machado
|
Recordações de Tramataia
|
Joaquim Cardozo |
|
"Eu vi nascer as luas fictícias"
RECORDAÇÕES DE TRAMATAIA
I
Eu vi nascer as luas fictícias
Que fazem surgir no espaço a curva das marés
Garças brancas voavam sobre os altos mangues
De Tramataia.
Bandos de jandaias passavam sobre os coqueiros
[ doidos
De Tramataia.
E havia um desejo de gente na casa de farinha e
[ nos mocambos vazios
De Tramataia.
Todavia! Todavia!
Eu gostava de olhar as nuvens grandes, brancas
[e sólidas,
Eu tinha o encanto esportivo de nadar e de
[ dormir.
II
Se eu morresse agora,
Se eu morresse precisamente
Neste momento,
Duas boas lembranças levaria:
A visão do mar do alto da Misericórdia de Olinda
[ ao nascer do verão.
E a saudade de Josefa,
A pequena namorada do meu amigo de
[ Tramataia.
1934
•••o•••
"onde há cajus
e mangabas"
CHUVA DE CAJU
Como te chamas, pequena chuva inconstante e
[ breve?
Como te chamas, dize, chuva simples e leve?
Tereza? Maria?
Entra, invade a casa, molha o chão,
Molha a mesa e os livros.
Sei de onde vens, sei por onde andaste.
Vens dos subúrbios distantes, dos sítios
[ aromáticos.
Onde as mangueiras florescem, onde há cajus e
[ mangabas,
Onde os coqueiros se aprumam nos baldes dos
[ viveiros
E em noites de lua cheia passam rondando os
[ maruins:
Lama viva, espírito do ar noturno do mangue.
Invade a casa, molha o chão,
Muito me agrada a tua companhia,
Porque eu te quero muito bem, doce chuva,
Quer te chames Tereza ou Maria.
1936
|