Número 8

16/05/2014

«Os ovos dos pássaros são pêssegos de cálcio.» (Francisco Carvalho) *
 


         Da Costa e Silva


Caros,

Um poema antológico do poeta simbolista Da Costa e Silva (1885-1950).

Nascido em Amarante, PI, Antônio Francisco da Costa e Silva formou-se advogado pela Escola de Direito do Recife. Foi funcionário do Ministério da Fazenda e trabalhou em vários estados, como Maranhão, Amazonas, São Paulo e Rio Grande do Sul.

Na poesia, estreou com o livro Sangue (1908), ao qual se seguiram os volumes Zodíaco (1917), Verhaeren (1917), Pandora (1919) e Verônica (1927). Suas Poesias Completas já tiveram quatro edições: em 1950, 1975, 1985 e 2000.

Da Costa e Silva é pai do também poeta, diplomata e especialista em estudos africanos Alberto da Costa e Silva.

 

Carlos Machado


 

 

 



 

Uma canção, várias tristezas

Da Costa e Silva




SOMBRA E NÉVOA

Cai o crepúsculo. Chove.
Sobe a névoa... A sombra desce...
Como a tarde me entristece!
Como a chuva me comove!

Cai a tarde, muda e calma...
Cai a chuva, fina e fria...
Anda no ar a nostalgia,
Que é névoa e sombra em minh’alma.

Há não sei que afinidade
Entre mim e a natureza:
Cai a tarde... Que tristeza!
Cai a chuva... Que saudade!
 



Rolling Stones



ESTA CANÇÃO TRISTONHA é uma pequena joia do simbolismo brasileiro. Singela e musical, ressoa em nossos ouvidos com a mesma graça de alguns dos versos de Verlaine, um dos mestres maiores do simbolismo francês.

O poema “Sombra e Névoa” foi escrito pelo poeta piauiense Antonio Francisco da Costa e Silva (1885-1950), ou Da Costa e Silva, como ele se assinava, bem ao gosto da época (veja ao lado alguns dados biográficos do poeta).

                                          •o•


DA COSTA E SILVA nos traz à lembrança um episódio do famoso Barão do Rio Branco. Monarquista empedernido, José Maria da Silva Paranhos Júnior (este era seu nome
o pai, também “nobre”, era o Visconde do Rio Branco), foi o titular do Ministério das Relações Exteriores no Brasil do final de 1902 até sua morte, em 1912.

Paranhos Júnior era o donatário dessa capitania ministerial. Vejam só o que ele fez com Da Costa e Silva, segundo relato de Guilherme Luiz Leite Ribeiro, no livro Os Bastidores da Diplomacia (Nova Fronteira, 2007, p. 50):

Nos tempos do barão do Rio Branco não havia concurso para ingressar na carreira diplomática, e a seleção era feita pessoalmente por ele, que conversava com os candidatos, em geral pessoas de família conhecida, de preferência bonitos e que falassem línguas estrangeiras. Antônio Francisco da Costa e Silva, ilustre poeta e pai do embaixador e acadêmico Alberto Vasconcellos da Costa e Silva, conversou com o barão sobre a possibilidade de ingresso na carreira, porém o chanceler foi taxativo: — Olha, o senhor é um homem inteligente, admiro-o como poeta, contudo não vou nomeá-lo porque o senhor é muito feio e não quero gente feia no Itamaraty...

Se o candidato a diplomata tinha de ser “bonito e de família conhecida”, o critério do barão era diferenciá-lo de quem? De negros e índios, obviamente! Da Costa e Silva não era negro nem índio, mas tinha cara de nordestino...

Outro absurdo: o barão, ministro da república, continuou a assinar-se “Rio Branco”, em flagrante desrespeito à Constituição.
 

                                          •o•


OUTRO FATO que envolve o nome de Rio Branco. Havia nessa época um político pernambucano chamado (Manoel da Motta) Monteiro Lopes, conhecido como o primeiro negro a ser eleito deputado federal no Brasil, em 1909. Nascido em Recife, Monteiro Lopes formou-se em direito, exerceu a profissão em sua cidade natal e em 1894 mudou-se para a capital do país. Popular, era conhecido como “advogado de irmandades”, “defensor dos operários” e “líder dos pretos”.

Em 1909, Monteiro Lopes foi eleito deputado federal e só tomou posse porque houve enorme mobilização de entidades populares em seu favor. Vejam o que conta a historiadora Carolina Vianna Dantas:

Contudo, no mês de fevereiro, a grande imprensa começou a noticiar a existência de rumores de que Monteiro Lopes não seria reconhecido como deputado federal. Os boatos diziam que Afonso Pena [o então presidente da república] e o Barão do Rio Branco não queriam um negro na Câmara dos Deputados, pois isso envergonharia o país.

 

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Outras Palavras

Carlos Machado, 2014

•  Outras Palavras
    Guilherme Luiz Ribeiro Leite:
         Os Bastidores da Diplomacia
        
Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 2007, p. 50
   
Carolina Vianna Dantas:
         Monteiro Lopes (1867-1910), um "líder da raça negra"
         na capital da república
,
         artigo na revista Afro-Ásia 2010 (41), da UFBA
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* Francisco Carvalho
  "Coisas da Terra", in Corvos de Alumínio (2007)