Número 2

14/08/2005

"Dentro de mim mora um grito./ De noite, ele sai com suas garras, à caça/ De algo para amar." (Sylvia Plath)
 


   Picasso: Dom Quixote



Caros,

Nesta página, como num blog, pretendo registrar notícias e observações variadas.

Carlos Machado


 

 



 

Camões era carioca!

 


CAMÕES, TRAÍDO PELA RIMA

Os cariocas, como sabemos, incluem em certas palavras um fonema i que não existe. É o caso de "nascer", que muitos deles pronunciam "naiscer"; ou de "mesmo", transformado em "meismo". Essa prosódia descende diretamente do português de Portugal. Ouçam bem o lisboeta falando "Cascais". Até aí, nenhuma novidade.

Mas agora passei a desconfiar que a pronúncia luso-carioca vem desde tempos camonianos — ou seja, desde os primeiros anos da Terra de Santa Cruz.
Confiram a rima perpetrada pelo vate Luís Vaz de Camões nos segundos versos dos dois tercetos no soneto abaixo (destaques em verde). Não há dúvida: Camões era carioca!


POR QUE QUEREIS, SENHORA,
QUE OFEREÇA

Por que quereis, Senhora, que ofereça
A vida a tanto mal como padeço?
Se vos nasce do pouco que mereço,
Bem por nascer está quem vos mereça.

Sabei que, enfim, por muito que vos peça,
Que posso merecer quanto vos peço;
Que não consente Amor que em baixo preço
Tão alto pensamento se conheça.

Assim que a paga igual de minhas dores
Com nada se restaura; mas
deveis-ma,
Por ser capaz de tantos desfavores.

E se o valor de vossos servidores

Houver de ser igual convosco
mesma,
Vós só convosco mesma andai d'amores.


(Incluído em 14/08/2005)




O MESTRESSALA

Está no forno novo livro do poeta mineiro Edimilson de Almeida Pereira. Trata-se de O Mestressala. A primeira parte do livro, um poema longo com o título "Enredo", está disponível no site da revista Ciência e Cultura, da SBPC. Edimilson, nascido em Juiz de Fora, tem obra poética de alto nível já publicada. Seu trabalho foi objeto do boletim poesia.net n. 114. Para ler a parte inicial de O Mestressala, clique aqui.

(Incluído em 14/07/2005)


A CHUVA NOS RUÍDOS

A poeta paulista Vera Lúcia de Oliveira recebe este mês o prêmio de melhor livro do ano de 2004, concedido pela Academia Brasileira de Letras. O volume destacado é A Chuva nos Ruídos, antologia publicada pela Editora Iluminuras, de São Paulo. O volume inclui poemas de cinco livros de Vera Lúcia: Pássaros Convulsos, Tempo de Doer, Pedaços, Geografia de Sombra e A Porta Range no Fim do Corredor, títulos citados do último para o primeiro.

Vera Lúcia de Oliveira é uma escritora brasileira com uma história singular. Residente na Itália, ela escreve de forma bilíngüe, e também conquistou vários prêmios de poesia em idioma italiano. Portanto, Vera tornou-se também uma poeta italiana. Na antologia premiada pela ABL está o seguinte poema:

PÁSSAROS CONVULSOS

ave em carne viva
ave em tumulto
ave no osso
ave no uso
asa gravada
no sangue

ave na pressa
ave em vôo convulso
pronta
pra qualquer
fresta
ave torta
e ávida
em revoada
provisória

 

Vera Lúcia de Oliveira - A Chuva nos Ruídos
Escrituras Editora
São Paulo, 2004

(Incluído em 14/07/2005)




ELES CANTAM O TEXTO DOS POETAS

O Música Surda é um quarteto carioca de voz, violão e canções — todas compostas pelos próprios integrantes do grupo. As músicas são excelentes, idem para a voz e o instrumental. Um detalhe marcante está nas letras, que são textos de grandes poetas: Camões, Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles, Federico García Lorca. O nome do grupo vem de um dos poemas musicados, escrito pelo carioca Dante Milano (1899-1991).

Aliás, a canção "Música Surda" foi o chamariz que me levou ao site do grupo (www.letras.ufrj.br/musicasurda). Lá você pode ouvir as canções e ler os poemas. Outro ponto que destaca o quarteto é sua determinação em fazer música de qualidade, sem prestar vassalagem aos ditames da moda e às exigências do mercado.

O Música Surda é formado por Andréia Pedroso (voz), Antonio Jardim (violão de 6 cordas, requinto e violoncelo), Celso Ramalho (violão requinto e de 6 cordas) e Eduardo Gatto (violão de 8 cordas). Sucesso ao Música Surda.

(Incluído em 24/04/2005)




PALESTRAS MARCAM O ANO DA FÍSICA

Eu sempre achei que física e matemática avançadas têm tudo a ver com poesia. Tanto que mostrei, no boletim poesia.net n. 70, dois versos de Emily Dickinson que antecipam, poeticamente, o enunciado do Princípio da Incerteza, de Werner Heisenberg.

Portanto, poetas, seresteiros, namorados, correi: este é o Ano Mundial da Física e coincide com o centésimo ano da Teoria da Relatividade, publicada por Albert Einstein em 1905. Por isso, o Instituto de Física da USP está promovendo uma série de palestras para o público em geral sobre temas fundamentais da física moderna: relatividade, teoria quântica, nanociência, cosmologia.

As aulas, realizadas em São Paulo, vão de 02 de abril a 10 de novembro, cada uma repetida em três locais: Estação Ciência, Museu Paulista e Centro Universitário Maria Antonia.



(Incluído em 06/04/2005)
 


O "CINEMA" DE RICARDO ALEIXO

Como quem tivesse uma câmera na mão e palavras na cabeça, o poeta Ricardo Aleixo captou essa bela seqüência de imagens do menino Exu felino no poema "Cine-Olho". Uma pequena jóia de contenção, força e comunicação.


CINE-OLHO

           Ricardo Aleixo

Um
menino
não.
Era
mais
um
felino
um
Exu
afelinado
chispando
entre
os
carros

um
ponto
riscado
a
laser
na
noite
de
rua
cheia

ali
para
os
lados
do
Mercado.
 

(Incluído em 27/03/2005)
 



IARARANA 10

Publicada desde 1998, a Iararana, revista baiana de arte, crítica e literatura, chega agora ao seu número 10. A edição põe em destaque uma entrevista com o escritor Guido Guerra, autor do romance Lili
Passeata
. A seção de poesia traz trabalhos de nomes conhecidos como Foed Castro Chamma, Vera Lúcia de Oliveira e Floriano Martins. A Iararana é editada por Aleilton Fonseca, Carlos Ribeiro e José Inácio Vieira de Melo.
 

Iararana Revista de arte, crítica e literatura
Número 10 — dezembro 2004
Rua Rubem Berta, 267/402 — Pituba
41820-040 — Salvador, BA

(Incluído em 30/01/2005)




ESTRÉIA A REVISTA JANDIRA

"O mundo começava nos seios de Jandira". Este é o lema da novíssima revista de literatura Jandira, que herda o nome do poema de Murilo Mendes e tem sede na cidade natal do poeta, Juiz de Fora, MG. Além de um visual gráfico caprichado, a revista traz em seu número de estréia uma suculenta seleção de poesia, prosa e ensaio contemporâneos. Tudo novo, cheirando a século XXI e, ao mesmo tempo, com um pé bem firme na boa tradição literária.

Logo nas primeiras páginas, Jandira oferece uma entrevista com o poeta maranhense Ferreira Gullar. Em seguida, vem a seção de poesia, com textos de outros poetas. Depois, vem o bloco dedicado à prosa, seguida dos ensaios. Vêm, por fim, um fragmento inédito da poeta e ficcionista paulista Hilda Hilst, desaparecida em janeiro deste ano, e nova seção de poesia, esta dedicada a traduções de poesia italiana.

Jandira é uma boa notícia para todos os que apreciam a literatura e se interessam pela sua difusão. Editada pelo poeta Ricardo Rizzo, também de Juiz de Fora, a revista faz jus ao seu patrono e homenageado, Murilo Mendes.
 

Jandira - Revista de literatura
Número 1- Primavera de 2004
Funalfa Edições, Juiz de Fora, MG

(Incluído em 18/10/2004)



AMÁLGAMA, A POESIA DE ROBERVAL

O poeta baiano Roberval Pereyr acaba de lançar Amálgama - Nas Praias do Avesso e Poesia Anterior, volume que reúne seis livros, quase todo o seu trabalho poético. Dono de um lirismo sensível e musical, Pereyr revela-se um mestre na construção de canções. Vejam este exemplo:


CANÇÃO - 1

Meu barco sou eu sem barco
no mar das dúbias viagens.

Nas noites em que não parto
enfrento monstros às margens

de mim prostrado no escuro.

Mas amanheço, não tardo
ao lado desta voragem

(tremor do ser, fria imagem)
que os deuses infelizardos

escavam nos homens puros.

                    (De Saguão de Mitos, 1998)
 

Roberval Pereyr - Amálgama
Secretaria de Cultura e Turismo/Fundação Cultural do Estado da Bahia. Salvador, 2004.

(Incluído em 10/09/2004)
 

poesia.net
Outras Palavras

Carlos Machado, 2004-05

•  Outras Palavras
    Início desta página: 10/09/2004
   
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